26/02/2017

O MICROCOSMO E SEU OBJETO DE IDEAÇÃO

Shrii Shrii Anandamurti 
12 de maio de 1979, Fiesch, Suíça. 

       O discurso de hoje é “O microcosmo e seu objeto de Ideação".
       O microcosmo é uma conação macropsíquica¹  e, portanto, todas as atribuições do Macrocosmo, todas as regras do Macrocosmo, também estão presentes no microcosmo, mas em forma de miniatura. Por natureza, o microcosmo é uma... contraparte objetivada do Macrocosmo. E, por estar dentro do âmbito infinito do Macrocosmo, ele continua movendo-se e movendo-se. O caminho é infinitamente longo. O microcosmo vai continuar movendo-se até atingir aquela meta específica. Qual seria a meta? Uma das regras psíquicas é que qualquer objeto toma a forma de sua meta, ou seja, ele é transmutado em seu próprio objeto. Portanto, o objeto de ideação do microcosmo deve ser selecionado com muito cuidado. 


    Agora vejamos: qual deve ser o melhor objeto de ideação?

    Primeiramente, consideremos o caso do tempo, o Tempo Eterno.

    O que é isto? Trata-se de uma medição psíquica da motilidade da ação. Agora, será que ela pode ser o objeto de ideação?
    Ela não pode ser o objeto de ideação, porque a primeira coisa é que ela é uma medição psíquica. Para ocorrer uma medição psíquica, deve haver um corpo psíquico, ou seja, um corpo psíquico unitário. E se o corpo psíquico unitário mede o tempo, o tempo não pode ser a Entidade Suprema. Por isso, ele não pode ser o objeto de ideação. 
    A segunda coisa é [...] que se trata de uma medição psíquica. [²] [...] Medição psíquica significa mobilidade psíquica. E mobilidade psíquica significa uma mudança de lugar. A entidade que requer uma mudança psíquica de lugar ou de espaço não pode ser a Entidade Suprema. Por esta razão também, o Tempo Eterno não pode ser o objeto de ideação de vocês.


    A terceira coisa é que esta medição depende da mobilidade ou motilidade da ação. O que é motilidade ou mobilidade? Ela também baseia-se na mudança de lugar ou de espaço físicos. Para isso se requer que este mundo físico seja criado, e depois que a medição da ação seja feita pelo corpo psíquico do Macrocosmo.
    Portanto, o fato é que a entidade cuja própria existência depende destes fatores físicos ou psicofísicos não pode ser a Entidade Suprema. Então, vemos assim que o Tempo Eterno não é a nossa meta; ele não é algo psíquico, e nem sequer é algo abstrato. É algo pior do que o abstrato. Portanto, ele é algo mais grosseiro do que os seres humanos; ao invés disso, os seres humanos é que são os criadores desta entidade. Portanto ela não é o nosso objeto de ideação; ela não pode ser o nosso objeto de meditação; ela não pode ser o nosso objeto de adoração ou de exaltação.
    
    Agora tomemos o caso da natureza. 

    Há algumas pessoas, ou houve algumas pessoas no passado que eram adoradoras da natureza, adorando árvores, adorando o céu, e assim por diante. Será que a natureza pode ser o objeto de ideação? 
    Não, certamente não. O que é a natureza? A natureza é o nome de um estilo particular segundo o qual o Princípio Operativo³ funciona. Ela é simplesmente um estilo. Esse estilo não pode ser o objeto de meditação ou de ideação. E a segunda coisa é que, como a natureza não é nada mais do que um estilo, se esse estilo torna-se o objeto, então a própria entidade será convertida somente em um estilo – em um mero estilo. É uma idéia tola. Portanto, tais adoradores da natureza podem ser estudiosos eruditos, mas na verdade eles vivem no paraíso dos tolos. A natureza não pode ser o nosso objeto de ideação.

    Terceiro, o Destino. 

    Houve, e há, muitas pessoas que são fatalistas. Os adoradores do destino. “Fatalista” significa adorador do destino – adorador da sorte e do destino. Eles são piores que os adoradores da natureza. O que é o destino? 
Não há nada chamado de destino neste universo. No que diz respeito à filosofia, não pode haver qualquer coisa chamada de destino. O que é o destino? 
    Toda e cada pessoa terá que sujeitar-se à reação de suas ações anteriores. Quando a ação original é conhecida, dizemos que esta é a reação daquela ação. Suponha que o seu dedo entre em contato com o fogo. Você vai sentir dor, você vai ter que sofrer – mas, nessa hora, você irá dizer, ou você irá sentir, que foi porque o seu dedo entrou em contato com o fogo que você está sofrendo. Mas quando a reação ocorre [  ] mais tarde e quando a ação original não é conhecida ou foi esquecida, ou quando a ação original aconteceu em uma vida passada, e você não sabe qual foi a ação original [  ] – neste caso você diz que isto “é o destino, é o destino”. Mas na verdade não existe destino. O que você chama de destino na verdade é a reação de nossas ações passadas. Em sânscrito isto é chamado de saḿskára. Saḿskára. Em latim, momenta⁶ reativos. 
Então, a terceira coisa... Portanto, o destino não pode ser o objeto de ideação. Destino é simplesmente a reação da ação original. E quando não existir uma ação original, não pode haver qualquer reação. Então a reação é uma criação da própria ação de vocês. Se a reação é uma criação da própria ação de vocês, vocês são os criadores, vocês são os pais da reação. Então, como pode a reação ser o objeto de ideação de vocês?
    Não. O ser humano não deve ser fatalista, o ser humano não deve ser adorador do destino, o ser humano deve ser firme. Você deve enfrentar firmemente todas as dificuldades, todas as conseqüências. Lembrem-se: vocês não devem ser fatalistas. Portanto, o destino não pode ser o objeto de meditação. Lute contra o destino.

    Então, algumas pessoas dizem que esta Terra é uma criação do acaso. Este universo é uma criação do acaso. O acaso é a causa essencial desta criação. Então, o acaso é o deus, porque ele criou o mundo. E portanto o acaso deverá ser o objeto de ideação.

    Esta também é uma idéia tola. O que é acaso ou acidente?

    Não existe nada chamado de acidente – tudo é incidente. Quando uma ação é materializada num intervalo de tempo curto – num intervalo de tempo muito curto – ou quando a causa básica da ação não é conhecida por nós – nós apenas estamos vendo a reação, apenas estamos vendo o incidente – o aspecto causal do incidente não é conhecido por nós – ou quando o aspecto causal é traduzido em ação dentro de um intervalo de tempo muito curto, nós dizemos que isto é um acidente. Mas na verdade nada é acidente, tudo é incidente. Por causa da nossa futilidade, ou por causa da nossa falta de conhecimento, nós dizemos que é um acidente. Quando o aspecto causal, quando o fator causal é traduzido em ação dentro de um intervalo muito curto – digamos, alguns segundos –, nós dizemos que é um acidente. E quando ele é traduzido em ação lentamente, nós não dizemos que é um acidente; nós dizemos que é um incidente. Portanto, um acidente não é algo providencial; ou, o nosso acidente não é algo fora do âmbito de tempo, espaço e pessoa. Porque todo acidente ocorre – todos os acidentes ocorrem dentro do escopo de tempo, espaço e pessoa. A entidade que está dentro – não fora – da periferia de tempo, lugar e pessoa não pode ser a meta de vocês, não pode ser o objeto de ideação de vocês, não pode ser o objeto de meditação de vocês e não pode ser... o criador ou a fonte de exaltação de vocês.

  Algumas pessoas dizem... que esses fatores quinqüelementais dos quais este universo é feito...

     Esses fatores quinqüelementais: o que são esses fatores? 
Eles não são nada além de uma forma condensada de energia. 
    E o que é energia? 
  Ela não é nada mais que uma forma condensada de estamina psíquica. Então, como podem esses fatores quinqüelementais deste mundo expresso serem o objeto de ideação? [  ] 
   Eles não podem ser a meta de vocês; eles não podem guiar vocês no caminho da beatitude. Portanto, aqueles que são adoradores ou meditadores dos fatores quinqüelementais são pessoas mal orientadas. Eles estão apenas desperdiçando a sua energia por nada.

   Algumas pessoas são da opinião de que a Energia Cósmica é a fonte original ou matriz causal do universo. Portanto, esta matriz causal deveria ser o objeto de ideação. 
     Mas o que é esta matriz causal? Matriz causal...
Essa Energia Cósmica não pode considerada como a matriz causal porque ela é uma força cega. A energia é uma força cega. A eletricidade é uma força cega. Ela é controlada pelo intelecto humano. Portanto, como a Energia Cósmica não tem apoio intelectual atrás de si, ela não pode ser a matriz causal. Porque em todos os lugares deste universo, vemos que todas as coisas seguem um estilo ordenado. Ou seja, existe algo intelectual por trás da Energia Cósmica. E é por isso que existe ordem em toda a parte. Existe sistema em toda a parte. Toda a criação tem uma ordem sistemática e por isso ela não pode ser criação de uma força cega ou de uma energia cega. Deve haver alguma força intelectual por trás dela. Portanto, a Energia Cósmica não pode ser tratada como a matriz causal, e não pode atribuir a ela... – não se pode atribuir nenhuma divindade a ela. Ela não pode receber a qualificação de matriz causal. 

    Algumas pessoas são da opinião de que existe a alma, de que existe um espírito em toda e cada estrutura e que esse espírito é a meta da nossa vida.  

    Vejam vocês, existem muitos espíritos e almas associados a muitos microcosmos. Mas eles têm que funcionar sob certas limitações. Eles não podem ir além da abrangência do microcosmo. Um objeto, ou melhor, uma entidade que tenha um alcance limitado como esse, tal como o espírito unitário ou a faculdade cognitiva unitária, não pode ser o objeto de ideação de vocês, não pode ser o Criador Supremo. 
    Então, quem é o objeto de ideação de vocês? Quem deve ser o objeto de ideação de vocês? Qual é o poder que criou vocês, que alimenta vocês e que põem vocês no Seu colo quando chega o momento apropriado? 
Ele é a Força Cognitiva¹⁰ por trás da Energia Cósmica. Ele controla a Energia Cósmica com o Seu poder intelectual e intuitivo. Ele é a Consciência Suprema. E na verdade Ele é a matriz causal, e Ele deveria ser o único objeto de ideação, o único objeto de meditação de vocês. E Ele é o Pai Supremo¹¹. Não há outra alternativa a não ser mover-se ao longo do caminho Dele. Ele sabe tudo. Unam-se com Ele.

   Agora, desde o exato início das suas vidas no passado distante até o ponto culminante de todos os seus movimentos e marchas, vocês estão com Ele, vocês estarão com Ele e... em nenhuma circunstância vocês estarão distantes Dele. Por isso, Ele é o único objeto de ideação – essa Consciência Suprema. 

   A raiz do significado do termo bábá é “o mais querido” ou “o mais próximo”. Como Ele é o Pai Supremo, a Consciência Suprema, Ele é Bábá de toda a criação. E como vocês são os seres criados, vocês são as amadas crianças Dele – vocês também são Bábá Dele – porque bábá significa “mais próximo e mais querido”.

    Como ele é o único objeto de ideação de vocês, e como o nome Dele é a única... projeção da entidade microcósmica de vocês, a única projeção de pensamento, a única projeção introversiva – projeção introversiva e extroversiva¹² –, então o nome Dele deveria estar sempre... com vocês, nas suas mentes, nas suas línguas, nas suas cordas vocais, em todos os lugares.


     E eu sinto, e eu também compreendo, e é por isso que eu digo: que quando os devotos Dele, as crianças Dele, cantam Bábá Nám Kevalam, Ele também canta Bábá Nám Kevalam¹³. 

    Kalyáňamastu. 
 [Que haja bem-estar.] 

* * *

Observação: As palavras em negrito correspondem aproximadamente a partes do discurso às quais o autor deu maior ênfase através da elevação do seu tom de voz. 

Revisão da transcrição do arquivo de áudio original, tradução e revisão da tradução: Mahesh – Florianópolis, 20 a 22 de março; 18 de setembro de 2009; 16 de março de 2011.

 Título original: Microcosm and Its Object of Ideation

Fonte: Edição Eletrônica das Obras de P. R. Sarkar – versão 7.5 (em inglês); e arquivo de áudio do discurso do autor. Publicado em: Subháśita Saḿgraha Part 12 Bábáin Fiesch (obras ainda não publicadas em português) 
______________

1 Nota do Tradutor (N.T.): Este é um aspecto da teoria cosmológica do autor. Tal afirmação equivale aproximadamente a dizer-se que todos os seres ou entidades unitárias (microcosmos) existem dentro de uma Mente Cósmica (Macrocosmo). Ou seja, suas existências dependem do funcionamento da Mente Cósmica – e mais: suas existências são propriamente pensamentos ou criações mentais (conações) dessa Mente Cósmica, e não possuem nenhuma existência separada da mesma.

 2 N.T.: Nesta altura, três frases do autor foram omitidas pois não estão completamente audíveis ou inteligíveis no áudio do discurso original. O que foi possível transcrever é o seguinte (incluindo as frases imediatamente precedente e subsequente): “Second thing is: […] that it is psychic measurement. Who measures? It is a […]. Now, psychic measurement means psychic mobility.”

3 N.T.: Aqui o autor lança mão de outro aspecto de sua teoria cosmológica – a saber: o Princípio Operativo é um dos dois princípios que, juntos, são responsáveis pela criação do universo manifesto, e inclusive da própria Mente Cósmica dentro da qual o mesmo existe. A interação desses dois princípios se dá com a influência do Princípio Operativo sobre o outro princípio, o Princípio Cognitivo. Em sua filosofia o autor explica que o Princípio Operativo pertence ou está subordinado ao Princípio Cognitivo. 

4 N.T.: Nesta altura, uma palavra do autor foi omitida pois não está completamente audível ou inteligível no áudio do discurso original.

5 N.T.: Esta última frase foi adaptada pois parte dela não está completamente audível ou inteligível no áudio do discurso original. O que foi possível transcrever é o seguinte: “…or the original action took place in another past life, [there is] not know what was the original action”. 

6 N.T.: plural de momentum - significando “impulso”, ou “quantidade de movimento”.

7 N.T.: Os chamados cinco fatores fundamentais. Em sua teoria cosmológica, o autor explica que esse cinco fatores fundamentais foram criados um após o outro, sucessivamente, dentro da Mente Cósmica, e que qualquer entidade material do universo manifesto é composta por uma combinação particular dos mesmos.

8 N.T.: Esta última frase foi adaptada pois parte dela não está completamente audível ou inteligível no áudio do discurso original. O que foi possível transcrever é o seguinte: “Then how […] these quinquelemental factors of this expressed world can be the object of ideation?” 

9 N.T.: O termo “Energia Cósmica” é um sinônimo de “Princípio Operativo”.

10 N.T.: Aqui, o termo “Força Cognitiva” é um sinônimo do antes mencionado “Princípio Cognitivo”. (Vide nota 3.) 

11 N.T.: O autor costuma referir-se à Consciência Suprema, ou ao Princípio Cognitivo, como “Pai Supremo”, e ao Princípio Operativo, ou “Energia Cósmica”, ou “Força da Natureza”, como a “Mãe Suprema”.

12 N.T.: “intro-cum-extroversial”, em inglês.

13 N.T.: O termo “bábá” já foi explicado pelo autor. “Nám” é uma raiz verbal em sânscrito que significa “Eu me entrego”. E “kevalam” significa que “é o único caminho, que não há alternativa”. De modo que o significado geral desse mantra pode ser entendido como “Somente a esse objetivo, a essa meta, eu me entrego” ou também “Eu estou tomando o nome da Entidade Suprema”.

06/02/2017

VOLTANDO PARA CASA¹


Shrii Shrii Anandamurti, Allahabad,Índia, 28 de maio de 1967. 



Em termos simples, o que temos a fazer é voltar para o lar de onde viemos. Todos nós viemos de Parama Puruśa, a Entidade Suprema, e do práńa-kendra, o núcleo do universo – quer dizer, Puruśottama. Nós temos de voltar para o mesmo lugar. É como o menino que brincou pelos campos o dia inteiro e agora que a noite está chegando, volta para casa. Sádhana é o processo de voltar para casa. A criança brincou fora o dia todo. Quando a noite se aproxima, ele pensa “O pai já deve ter voltado para casa. Eu também vou voltar para casa e sentar perto dele”. Quando uma pessoa está cansada deste mundo e das coisas mundanas, ela anseia voltar para a espiritualidade – quer dizer, para o seu lar.


E qual é a nossa morada permanente, a nossa casa? É Parama Puruśa paramáshrayah Shriinivásah. Aqui shrii se refere à Faculdade Criativa Universal, ou Parama Prakrti. Portanto, voltar para casa é uma tarefa simples. Não requer erudição, conhecimento ou capacidade intelectual – tampouco longas e tediosas palestras. As escrituras nos dizem que há três pontos a serem lembrados para voltarmos para casa. São eles: shravana [ouvir sobre o Supremo], manana [idear no Supremo] e nidi-dhyásana [meditar no Supremo com um fluxo ininterrupto da mente].

 Sabemos que a faculdade vibracional transforma ondas mais sutis em ondas mais densas na fase da criação. Hari kathá [conversa devocional] proporciona vibrações mais sutis. Você deve permitir-se receber essas ondas mais sutis. Já foi dito que as ondas sonoras são as mais sutis na sequência da expressão Cósmica. A importância de Hari kathá no desenvolvimento espiritual é grande. Ouvir a respeito de Deus é muito mais importante do que estudos sobre espiritualidade, uma vez que o som é mais sutil do que a forma visual. Portanto, sempre que tiver oportunidade, ouça o nome Dele e fale-o para outras pessoas. 

   Quando você fala o nome Dele para outros, você também o ouve. Esse duplo desfrute ao recitar o nome Dele é chamado de kiirtana. Bhajana, por outro lado, é quando você ouve sozinho o nome Dele².  Você deve fazer ambos: tanto bhajana quanto kiirtana. Isso é shravana. O efeito de shravana é que vibrações sonoras que estão se movendo do denso para o sutil são colocadas em movimento contra o fluxo da faculdade vibracional, no qual os sons mundanos se movem do sutil para o denso. Isso vai colocar um fluxo de sons em movimento reverso, o que irá levar a pessoa até o ponto inicial da faculdade vibracional. 

   Eu já afirmei que o ponto inicial da faculdade vibracional e o ponto culminante da faculdade primordial são um só e o mesmo. Vocês irão portanto atingir o ponto culminante da faculdade primordial. A fase vibracional é chamada de bhava – também bhava ságara ou bhava párávára [oceano da criação]. A palavra bhava consequentemente designa o reino inteiro do princípio vibracional. Esta é a esfera dos envolvimentos mundanos. O Caetanya ou Princípio Cognitivo dessa faculdade {vibracional} é chamado de Bhava, e a Shakti ou Princípio Operativo dessa faculdade {vibracional} é chamada de Bhavánii Shakti. Essa é a amarra mundana. Somente através de Hari kathá consegue-se atravessar esse oceano de bhava – o domínio inteiro da faculdade vibracional.

   Em seguida vem manana, isto é, pensar somente em Parama Puruśa e em mais ninguém. Se vier à sua mente o pensamento de qualquer outra pessoa ou coisa, atribua a qualidade de Brahma a essa pessoa ou coisa. Esse processo é manana; você aprende este processo por meio do Guru Mantra³.  O efeito de manana será levar você gradualmente do último ponto do princípio ou faculdade primordial até o ponto inicial da faculdade primordial. 

   Nesse ponto você encontra a faculdade básica ou princípio básico. O princípio ou faculdade básica é um ponto no triângulo não-equilibrado de forças. Ele está situado em um vértice específico do triângulo de forças. Manana pode levar você até esse ponto. O que então resta é o ponto da qualidade de “eu”  , o ego. Agora temos que remover essa qualidade de “eu”.

   Todos os pesos, todas as confusões, todas as considerações de respeito e desrespeito, tudo está ligado ao “eu”. Quando alguém discorda de você, você abre um processo judicial contra a pessoa. Por que você se dá a esse trabalho? Somente para provar que você está certo. Todos os incômodos e frustrações são somente devido ao ego individual. O fato é que mesmo depois de entregar tudo a Parama Puruśa, o seu arqui-inimigo – o “eu” – ainda permanece. Porque você dirá: “Eu entreguei tudo a Deus”. “Eu”, “eu”, “eu” – meu amigo, entregue esse “eu” a Deus. Somente assim a sua entrega será completa. Todos os problemas ocorrem por causa desse “eu”.

 Ratnákarastava grhaḿ grhińii ca padmá Deyaḿ kimapi bhavate Puruśottamáya Ábhiiravámanayanápahrtamánasáya Dattaḿ mana yadupate tvamidaḿ grháńa. 

[A Tua morada está transbordando de pedras preciosas e jóias. A deusa da fortuna é a Tua guardiã. O que posso Te oferecer, ó Senhor? Ah sim, existe uma coisa que Te falta, já que foi roubada pelos Teus devotos: a Tua mente. Portanto ofereço minha mente a Ti. Por favor aceite-a.] 

   Depois da entrega desse “eu”, Parama Puruśa fica satisfeito, pois você chegou ao ponto central do triângulo de forças

   Realmente a única tarefa a ser feita é entregar tudo a Ele. Tudo o que você possui – seu corpo, seu nome, fama, riqueza, tudo – você recebeu Dele. Então, o que você deve dar a Ele e como você fará isso? Até aqui você só estava devolvendo a Deus coisas que já pertenciam a Ele. Agora o que você tem que dar a Ele é algo que seja seu. Esse é o ponto crítico. Suponha que alguém lhe dê uma flor de presente e você lhe devolva a mesma flor.  Isso não é certo. Por que não dar o seu “eu” a Ele, que de qualquer forma é a fonte de todos os seus problemas, confusões e complicações? Não há nada mais precioso para você do que esse “eu”. Entregá-lo é a coisa mais difícil. Portanto, no shloka acima o devoto exclama:

 “Ó Senhor, este universo é a Tua morada. Ele está repleto de jóias preciosas. Tudo de valioso que existe neste mundo pertence a Ti. Então, qual presente precioso eu poderei Te dar? Tu não tens desejo de nada. Qual é o sentido em oferecer algo a alguém cuja casa está repleta de jóias preciosas? A toda-poderosa Prakrti é a Tua própria esposa; ao Teu desejo Ela fará inúmeras jóias em um instante: aghat́ana ghat́ana pat́iiyasii Máyá [„a habilidosa mão de Mayá, que consegue criar até mesmo coisas impossíveis de criar‟] – esse poder criativo está sempre pronto para Te servir. Ó Senhor dos senhores, embora eu anseie por Te oferecer algo, não sei o que poderia ser. Ainda que eu queira oferecer, Tu não tens desejo ou necessidade. Se nada Te falta, o que posso oferecer? Se eu soubesse de algo que Tu não tens, eu iria oferecer isso a Ti.” 

“Ó Senhor dos senhores, ouvimos dizer que Teus grandes devotos roubaram a Tua mente de Ti. O Senhor se torna o escravo dos Seus devotos. Um devoto rouba o coração do Senhor – quase que à força. Isso é feito abertamente, e não em segredo. Então, ó Senhor, tem uma coisa que Te falta: Tu não tens mente.” 

   O devoto diz: “Não Te desesperes, ó Senhor, eu estou Te oferecendo minha mente. Por favor a aceite.” 

  Essa oferenda da própria mente da pessoa ao Senhor é nididhyásana. O sentido intrínseco de nididhyásana é que todas as propensões da mente devem ser concentradas em um ponto que será oferecido a Parama Puruśa.

   Atualmente a mente humana consiste em cinqüenta propensões dominantes. Quando a estrutura humana ficar mais complexa ao longo da evolução, certamente o número dessas propensões também aumentará. O número desses vrttis não irá ficar em cinqüenta para sempre; ele irá aumentar. Similarmente, o número de glândulas aumentará, e também o número de subglândulas. E não apenas haverá aumento no número de propensões mentais: as propensões também sofrerão mudanças. O conceito de beleza também mudará com a mudança de perspectiva da mente humana. Uma coruja poderá então parecer bonita e um pavão, feio. 

  Portanto, shravana capacita a pessoa a cruzar a faculdade vibracional. Manana permite que ela cruze a faculdade primordial. E nididhyásana torna possível fundir-se na Entidade Suprema. Isso é a realização de Deus. Assim, o ponto essencial é despertar o mantra, independentemente de a pessoa fazer coisas intelectuais como ler e escrever ou não. O que é importante é ter shravana, manana e nididhyásana apropriados. Se a pessoa fizer isso, ela não mais achará difícil aprender a fazer qualquer coisa. Mantra caetanya com certeza conduzirá a mantra siddhi – à realização da meta suprema. O processo da sádhaná automaticamente irá despertar a devoção. 

   Quando você entrar em contato íntimo com a Entidade Suprema, você verá que não possui riqueza maior que a devoção. Todas as posses mundanas irão mostrar-se sem valor. Somente a devoção permite que você entre em contato íntimo com Ele. Essa é a meta da vida humana. Esse é o verdadeiro progresso. Você tem vagueado pelo labirinto por uma miríade de vidas. 

   Você tem avançado sempre em direção a esse estágio. Consciente ou inconscientemente, você está sendo atraído para Ele. Esse é o ápice da vida. Enquanto você não O tiver realizado, não haverá siddhi na sua vida. 


¹Nota do Tradutor (N.T.): Tradução do trecho final do discurso “Mantra Caetanya”. A presente tradução consiste na expansão e revisão da tradução existente no capítulo “Voltando para o Lar” do livro A Graça do Senhor – Parte 1, publicado em português.
²Nota do Editor da versão em inglês (N.E.): Kiirtana, assim como bhajana, pode ser praticado individualmente, mas é preferível praticá-lo coletivamente. 
³N.E.: Uma lição de meditação da Ananda Marga.
N.T.: O termo em inglês é “I”-hood. Em outro discurso o autor identifica o ego com ahaḿtattva ou o eu agente (“eu faço”) – diferente do sentimento puro de “eu” (mahattattva, “eu sou”) e do eu objetivado (citta, “eu fiz”). 5 N.E.: Quer dizer, você progrediu do princípio básico em um dos vértices do triângulo até Puruśottama, no ponto central do triângulo.

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Este texto é a tradução do trecho final do discurso “Mantra Caetanya”. A presente tradução consiste na expansão e revisão do texto intitulado “Voltando para o Lar”, no livro A Graça do Senhor – Parte 1, publicado em português. Tradução complementar e revisão: Mahesh, Petrópolis, 04 e 05/fev/2017. Título do discurso integral: “Mantra Caetanya” Fonte: Edição Eletrônica das Obras de P. R. Sarkar – versão 7.5 (em inglês). Publicado em: Ananda Marga Ideology and Way of Life in a Nutshell Part 11 [a compilation] Bábá's Grace [a compilation] {contém apenas uma parte resumida e adaptada do discurso integral} Discourses on Tantra Volume One [a compilation] Subháśita Saḿgraha Part 10 [unpublished in English] Supreme Expression Volume 1 [a compilation] 

Quem sou eu ?